O processo de gestação que, por conseguinte é o de criação, é a que se dedica a trama. A voz que narra, a fala, o dom que nos distingue das bestas. Não obstante um fluxo incontido, uma loquacidade voraz que, ao invés de verter sentido, causa o caos. Parece não haver racionalidade, somente o instinto. Portanto tudo é mobilizado por um mecanismo primitivo. «Não tente me tornar menos animalesca», repreende a narradora. O Verbo é um impulso natural.
Continuamos todos feras, não evoluímos. Somos prole de «uma simples partenogênese». Os símios nos rodeiam e nos escudamos com a lógica e a razão, enquanto escorre pelos trilhos das costelas um suor «tão escuro e fétido quanto à urina». Temos de invejá-los, incita a puta, a voz reinante nesse curso paginado, «seus sexos à mostra, a facilidade como fodem e parem sem prestar contas a ninguém». Afinal, existimos ao pagamento de nossas necessidades fisiológicas, da parturição. «O prazer e a dor são frutos do mesmo escarro». A puta expulsa seus fetos pela glote, vocábulos encarnados que exibem minúsculos rins, pulmões, genitálias úmidas e intumescidas.