Biá, uma psicanalista já reformada e apaixonada por livros, aborda a jovem jornalista Olívia, que está devastada por uma perda recente, com uma pergunta agitadora: «O que perdeu que a entristeça tanto?» Olívia, sentada à mesa, aceita a inesperada provocação, bem como o carinho e o interesse daquela mulher, afinal apenas uma estranha, desencadeando-se uma sucessão de encontros marcados por uma galopante intimidade entre as duas mulheres, que aos poucos vão revelando as suas histórias. «A nossa amizade começou assim, enquanto nos afogávamos», relata Olívia.
Com uma sensível alternância de vozes, à força narrativa, objetiva e linear de Olívia contrapõem-se as anotações esparsas e sarcásticas de Biá, cujos fragmentos de uma memória já gasta e pouco confiável conduzem a um ponto de viragem na história, para revelar ao leitor eventos que marcaram o passado dilacerante de cada uma, sublinhando a subtil ligação entre as diferentes formas de abandono sofridas, e perpetradas, pelas duas amigas.
Depois do estrondoso sucesso de Tudo É Rio — em adaptação para cinema —, que fez de Carla Madeira a autora mais lida no Brasil, A Natureza da Mordida sublinha o estatuto cimeiro da escritora e a sua capacidade admirável para fazer com que as personagens saltem do papel.