Era uma vez um conto de fadas recheado por outros 49 contos de fadas. Este é O conto dos contos, com que Giambattista Basile nos presenteou no início do século XVII. Escrito em napolitano para entretenimento da corte, O conto dos contos inspirou mestres da literatura como os irmãos Grimm e Charles Perrault, ou do desenho animado como Walt Disney. Nos cinquenta contos que compõem o Conto, ogros horrendos de bom coração, donzelas não muito castas, príncipes valentes e princesas mimadas, dragões malvados, rapazes tolos, mas audazes, animais falantes, belíssimas fadas, reis e rainhas, são elevados pela primeira vez à categoria de personagens da literatura, com seus encantamentos e magias. O Conto percorre o imaginário popular, sobretudo napolitano, mas também vai buscar na mitologia e na tradição de outros povos seus argumentos. Histórias que circulavam entre o povo miúdo e no mais das vezes eram contadas às crianças, são reelaboradas em chave irônica, quase iconoclasta, o que vale ao livro o subtítulo de o entretenimento dos pequeninos, «o que não queira dizer (como alguns, e entre estes Grimm, acreditaram, tomando ao pé da letra o título jocoso) que fosse composto para crianças. Era, ao contrário, composto para homens, para homens literatos, experientes e vividos, que sabiam entender e saborear coisas complicadas e engenhosas» (Benedetto Croce). Pela primeira vez se contou a história da moça obrigada pela madrasta a limpar a casa (A gata borralheira); do gato esperto que faz o dono enriquecer (O gato de botas); da menina presa numa torre que joga os cabelos para o namorado (Rapunzel); das duas crianças deixadas no bosque pelo pai a pedido da madrasta (João e Maria), e tantas outras memoráveis figuras encantadas que hoje fazem parte do nosso imaginário. São histórias engraçadas e assustadoras, românticas e terríveis, em que o autor não poupa os detalhes sórdidos, eróticos e escatológicos, embaladas pelas alegorias e metáforas intermináveis próprias do período barroco. Entrar no mundo mágico e exuberante criado por Basile é participar do maravilhoso e do atemporal, do fascínio de quase quatrocentos anos de literatura.