Ao revisitar a vida e a obra do arquiteto Edgar Graeff, Wilton Medeiros traz subjacente algumas polêmicas: por quê Graeff não é suficientemente estudado dentro da academia como referência? Por que se estuda, atualmente tanto, as obras e não o pensamento dos arquitetos? Por que se atrela o fundamento da teoria a uma prática, se quando essa prática foi exatamente a de um professor que professou a importância do outro, uma ética da alteridade, da justiça social, em pleno período da ditadura militar nos anos 60–70? E quais as formas de resistência a arquitetura poderia fornecer, naquela época? Sobretudo qual o papel da crítica de arquitetura? Como diz Wilton: «então temos aí, claramente, uma crítica não somente ao modo como se produzia conhecimento arquitetural, mas também à ingerência institucional nessa questão».
Como resposta a tais interpelações, sua obra de Graeff adquire contornos de um “tornar-se humano”, de um afeiçoar-se ao injuriado. Não por acaso, uma obra muito representativa disto, recebe o título de Arquitetura e o homem, cujos objetivos mais importantes da formação teórica do arquiteto estariam implícitos em sua tarefa central que é a edificação de ambientes para a existência humana. Graeff sabia e pontuava seu horizonte, mais importante que a arquitetura e ou cidade é o humano que vive dentro delas, esse humano vai assumir a dimensão ética da morada e de quem não tem morada, uma aproximação a ética de Emmanuel Levinas. Wilton nesse breve livro não só vai explanar sobre as obras de Graeff mas principalmente de seus livros e de seu pensamento como obras, o caráter performativo do mestre como bra também. Toda sua vida é pautada por essa crítica social. Nesse tempo no qual vivemos sobre a mazela dos estudos revivalistas modernos e de sua retóricas e gramaticas; como se a arquitetura fosse um objeto autônomo e afastado da realidade; Wilton traz indiretamente essas contundentes questões aos arquitetos, confrontar as duras realidades sociais que vivenciamos e se agravam dia a dia; de lá pra cá a coisa só piorou. Como bem apontava Graeff esse formalismo é destituído de conteúdo por excluir o «conteúdo humano”, reafirmando continuamente que o sentido da arquitetura é e deve ser sempre a “morada humana”. O sentido da arquitetura é o humano, fora disso não há sentido.
Para muitos arquitetos que se formaram a partir dos anos 90, em plena pós modernidade, a obra e principalmente o legado teórico dos livros de Graeff pode parecer ultrapassado e incompreendido. A pós modernidade na arquitetura esvaziou totalmente a questão ideológica e o humano entranhado nas fundações da arquitetura e do ensino de arquitetura. Como atesta Wilton em uma frase emblemática «podemos apenas imaginar que o seu legado escrito é sobretudo uma postura ética sobre como “tornar-se humano”. Um abrir de possiblidades para se dizer como Guimarães Rosa, que, 'mestre não é quem ensina, mas quem, de repente, aprende”. Wilton pensa Graeff com Derrida e Levinas, como um desconstrucionista que luta contra o ensino da arquitetura que privilegia as elites. O “outro” sentido da arquitetura: introdução à obra de edgar graeff e ensino é uma importante porta que se abre, um convite para que outros trabalhos venham a se somar, visto que a obra escrita de Graeff é bastante extensa e ainda pouco estudada.
Fernando Freitas Fuão
Prof. Titular da Faculdade de Arquitetura. UFRGS.