Entre o silêncio da ação bem-sucedida e o mutismo da impotência social e política, instala-se um discurso que visa alcançar a primeira e eliminar a segunda: o discurso da teoria política, que nasce quando todas as condições objetivas parecem aniquilar seu sentido. O livro político é aquele escrito quando tudo parece exigir silêncio. Mas, porque escrito quando a linguagem, e a escrita em particular, tornou-se inútil ou serva do poder vigente, o livro ganha uma significação nova que só é possível desvendar graças à crítica da cultura que o fez nascer. Assim, no lugar da suposta incoerência de Rousseau, vem colocar-se um discurso que é reflexão sobre sua própria origem e sobre sua destinação social e histórica. Circunscrito entre dois silêncios, o ato de escrever aponta em seu próprio interior para a questão que o suscita: a passagem da teoria à prática, uma vez cumprida a passagem do tácito ao expresso. (Marilena Chaui).