Análise, teimosia do sintoma e migração é um belo título e também uma afirmação condutora desta coletânea de textos psicanalíticos. Daniel Delouya nos convida a entrever seu trabalho amadurecido pelos anos. A escuta psicanalítica nada tem de ingênua; seu objeto vem sendo epistemologicamente construído pela metapsicologia e por teorizações diversas no esforço de atender a hipóteses de pensamento clínico e manejos transferenciais. A partir dela acompanhamos sua atividade, seja sentado em sua poltrona, seja para além dos limites do consultório, atento aos sons e ritmos das vozes e dos silêncios espraiando-se pelo espaço público. Seu estilo rebate entre si as
camadas da experiência emocional, das questões clínicas e das elaborações teóricas psicanalíticas. O leitor encontra uma trama arduamente tecida, sob a qual se fazem presentes, discutidas sob ângulos complementares, porém não exatamente contínuos, «as metas da psicanálise na clínica e na cultura». Calcado na raiz freudiana, o autor
traz reflexões conduzidas no caldo da civilização contemporânea, marcada pela produção de vulnerabilidades narcísicas. Estas certamente observadas na cena psíquica individual, contudo geradas por algo da ordem coletiva e impessoal. Quando a teimosia do sintoma deixa de ser marca de algo de que se livrar e passa a ser traço estilístico de apropriação psíquica, ocorre a migração por expandir os domínios do eu sobre as terras estrangeiras do isso, tornando-as pensáveis, de acordo com o proposto
por Freud na conferência n. 31, «A dissecção da personalidade psíquica», de 1933. Eis a concepção partilhada por Daniel Delouya para a cura pela psicanálise!
Mara Selaibe
Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae