Uma obra de arte nunca está encerrada em si. Além da concepção do artista, se completa com o olhar do público — e, portanto, a percepção sobre ela é moldada por vários fatores, como o momento histórico, os costumes e valores de uma época e os afetos e memórias que atravessam o espectador. Assim, a arte e a cultura estão (ainda bem) sempre passíveis a novas interpretações, especialmente quando se abre espaço para a pluralidade de vivências.
Na reportagem de capa deste mês, a repórter especial Débora Nascimento se debruça sobre a complexidade do assunto e como o revisionismo, tema tão discutido nos dias de hoje, é parte natural das disputas narrativas. Ao colocar em xeque elementos problemáticos de uma obra, como a naturalização de estereótipos raciais, de gênero, sexualidade, entre outros, pode-se fomentar o diálogo sobre questões estruturais da nossa sociedade, no passado e no presente.
Nesse movimento, músicas, livros, filmes, quadros, monumentos, entre outros, têm sido alvo de debates acalorados sobre suas mensagens e valores. Com as redes sociais e suas possibilidades de ecoar vozes de grupos historicamente silenciados, abrem-se novos caminhos para a representatividade e, com isso, clássicos têm passado por revisão e, muitos deles, condenados a um ostracismo futuro.
Como mostra a matéria, repensar símbolos e ressignificar nossa visão de mundo é um movimento constante. Pensemos, por exemplo, no Bicentenário da Independência do Brasil, que acontecerá em setembro. Para o escritor, professor e historiador Luiz Antonio Simas, em entrevista à repórter especial Luciana Veras, nessa data, deveríamos promover uma «descomemoração», ou seja, repensá-la, fazer uma autópsia do processo e entendê-lo em suas várias facetas. «Não acredito em isenção na História. Faço História engajada com um processo de transformação social», afirma.
Ao perceber os processos de mudanças culturais para além de uma divisão binária entre bem e mal, podemos compreender o nosso e outros tempos de uma maneira mais holística. É por esse prisma que a pesquisadora Carolina Dantas analisa o TikTok no artigo deste mês — o aplicativo que já conta com mais de 1 bilhão de usuários e que tem reconfigurado mecanismos da cultura, política e modelos de comportamento. Boa leitura!