Escrito durante o período de transição política nos EUA, em que tanto o movimento dos Direitos Civis quanto o do Black Power já não forneciam mais orientações claras para o ativismo negro, Do Black Power ao Hip-Hop busca delinear, no rescaldo desses movimentos sociais, os rumos que o ativismo negro tomaria ou deveria tomar e o que representou a ascensão do hip-hop.
As lutas pelos direitos civis propiciaram que muitos afro-americanos tivessem acesso a faculdades, universidades e bons empregos; o discurso de ódio contra os negros presente na cultura popular americana caíra em desuso; e uma classe média negra beneficiada pelo fim da segregação racial se expandia, sugerindo que o racismo sistêmico era coisa do passado. O sonho de Martin Luther King parecia estar se tornando realidade.
O que chamava a atenção era que enquanto muitos americanos, brancos e negros, queriam desesperadamente acreditar que o racismo era coisa do passado, o hip-hop desafiava essa visão otimista. Jovens negros provenientes de bairros com graves problemas sociais e oportunidades cada vez menores, apontavam as verdades incômodas sobre as habitações precárias em que viviam, os professores não qualificados das escolas que frequentavam, o dia a dia oprimido entre a indústria de drogas que transforma seus bairros em «cracolândias» e o policiamento punitivo que vê todos os moradores de determinado lugar como criminosos em potencial.
Pois assim como a remoção dos avisos de “apenas brancos” dos bebedouros não significava que todos pudessem beber deles, as ações afirmativas também não significavam que todos obteriam educação ou bons empregos. Além disso, um novo modelo de racismo, mais ardiloso, baseado em políticas de persistente guetificação urbana e encarceramento em massa criava uma nova segregação. A economia, afinal, é a nova eugenia.
Patricia Hill Collins, referência mundial nos estudos sobre negritude, em especial sobre o feminismo negro, traça a gênese desses movimentos na sociedade estadunidense, com suas peculiaridades, mas o leitor brasileiro também poderá notar os inúmeros pontos em comum desse “racismo sem racistas” com a nossa realidade.
O prefácio e a entrevista, exclusivos para esta edição brasileira, discorre sobre o debate contemporâneo brasileiro, a emergência de uma nova geração de intelectuais negras e a profunda esperança da autora na potência transformadora dessa produção para o fortalecimento da luta antirracista.