O livro Maternidade: uma análise sociocultural lança um olhar sobre um conjunto de práticas discursivas responsáveis pela construção de uma concepção ideal de mulher que se alcançaria mediante o exercício da maternidade. A obra propõe-se a identificar como a maternidade passou a ser apregoada por diversas instituições e a circular imoderadamente no campo social. A pesquisa focaliza o período que vai desde o final do século XIX até as primeiras décadas do século XX, momento em que se assistiu a uma grande preocupação médica com a mortalidade infantil, que por consequência, aguardava uma política pública eficiente, capaz de reduzi-la a um patamar aceitável por uma sociedade que se pretendia civilizada. Já que a alta taxa da mortalidade infantil relacionava-se principalmente aos problemas digestivos, os médicos passaram a estabelecer uma relação direta entre o serviço das amas de leite e o alto índice da mortalidade de recém-nascidos. Dessa forma, construía-se um nexo causal entre a baixa qualidade do leite fornecido pelas amas e o alto índice de óbitos infantis ocasionados por disenterias e enterites. Ao mesmo tempo que o olhar médico projetava desconfianças variadas sobre o trabalho das amas, ia se fortalecendo um discurso de exaltação da mulher na qualidade de mãe, a quem se destinava a importante missão de cuidar das crianças. Entre esses cuidados, a amamentação do recém-nascido pela própria mãe passou a ser algo identificado como uma prática essencial. Assim, foi-se valorizando positivamente a maternidade por meio da construção de enunciados que iam sendo tecidos de maneira contínua a partir de uma mescla de considerações científicas, morais, filosóficas, religiosas, legais, pedagógicas e até mesmo artísticas.